terça-feira, 18 de novembro de 2014

DVD Nas Paredes será lançado na mostra Cine Esquema Noise (2014)



Filme sobre o mítico álbum Paêbirú, de Lula Côrtes e Zé Ramalho, encerra a programação da mostra “Cine Esquema Noise”. Será o lançamento nacional do DVD.

O documentário longa-metragem Nas Paredes da Pedra Encantada, sobre o álbum duplo Paêbirú – Caminho da Montanha do Sol (tido como o mais “caro e raro” da música brasileira), gravado pela dupla Lula Côrtes & Zé Ramalho em Recife (PE), em 1974, vai encerrar, no dia 03 de dezembro (com lançamento do filme em DVD pela Monstro Discos), a mostra “Cine Esquema Noise”, em Goiânia (GO).

O “Cine Esquema Noise”, que vai de 27 de novembro a 03 de dezembro, é uma realização da Monstro Discos e da Saraivada Produções Culturais. A mostra integra a programação oficial da 20ª edição do Goiânia Noise Festival.

Serão exibidos, ao todo, 20 filmes sobre música, em diversos gêneros e formatos, além de obras clássicas e produções inéditas oriundas de várias regiões do Brasil.

Uma programação intensa que, no dia 27, começa com a com projeção, em VHS, do filme Hated: G.G. Allin and the Murder Junkies (Todd Phillips, 1993, 90’, EUA) e Geração Baré-Cola: Usuários de Rock (Patrick Grosner, 2014, 73’) e que também contará com produções inéditas como, por exemplo, Ratos de Porão: 30 Anos Crucificados Pelo Sistema.

Nas Paredes da Pedra Encantada é o filme que, no dia 03 de dezembro, às 19h, encerra a mostra com o seu lançamento em DVD (título que estreará a recém-criada “Monstro Filmes”) e, ainda, uma palestra com o jornalista e diretor Cristiano Bastos. O documentário, que virá com textos, fotos e artes gráficas, assinadas pelo artista goiano Wesley, foi legendado em inglês para atender o mercado internacional.

Paêbirú: marco da psicodelia brasileira e mundial

O álbum duplo Paêbirú – Caminho da Montanha do Sol é dessas joias oníricas perdidas nos alfarrábios da psicodelia mundial. Segundo o dono do selo norte-americano Time-Lag (que fez a primeira edição digital do álbum fora do Brasil), Nemo Bidstrup, o álbum guarda fortes conexões com a psicodelia norte-americana, inglesa e europeia. Porém, o teor de sua musicalidade é absolutamente “verde-amarela”. “É uma sonoridade decididamente brasileira”, ele observa.

Todavia, Paêbirú segue maldito 35 anos após seu lançamento. Muito por conta das inúmeras – e fantasticamente lisérgicas – histórias que marcaram sua concepção, gravação e, por fim, a perda da maior parte da prensagem original, levada pelo dilúvio que, em 1975, varreu a capital pernambucana. Das 1.300 cópias iniciais, 1.000 delas foram, literalmente, por água abaixo do Rio Capibaribe. E a calamidade levou junto, ainda, a “fita máster”. Bem conservado, um original está avaliado em mais de 4 mil reais (1.200 euros). É o mais caro álbum da música brasileira, segundo especialistas.

Cine Esquema Noise:
Quando: de 27 de novembro a 03 de dezembro de 2014
Onde: Cine Cultura, Goiânia (GO) – Praça Doutor Pedro Ludovico Teixeira, 2 - Setor Central, Telefone: (62) 3201-4670
Entrada Gratuita

Programação:

27/11 (Quinta-feira)
19h – Sessão especial de abertura da mostra Cine Esquema Noise com projeção em VHS do filme Hated: G.G. Allin and the Murder Junkies (Todd Phillips, 1993, 90’, EUA).
21h – Geração Baré-Cola: Usuários de Rock (Patrick Grosner, 2014, 73’).

28/11 (Sexta-feira)
19h – Di Melo: O Imorrível (Alan Oliveira e Rubens Passaro, 2011, 24’).
19h30 – O Diabo Era Mais Embaixo (Manu Maltez, 2014, 45’).
20h30 – Desagradável (Fernando Rick, 2013, 120’).

29/11 (Sábado)
17h – Ruído das Minas: A Origem do Heavy Metal em Belo Horizonte (Filipe Sartoreto, Gracielle Fonseca e Rafael Sette Câmara, 2009, 83’).
18h30 – Botinada: A Origem do Punk no Brasil (Gastão Moreira, 2006, 75’).
19h30 – Pelos Escombros (Ivan Vale Ferreira, 2009, 50’).
20h30 – Inocentes: 30 Anos (Carol Thomé e Duca Mendes, 2011, 30’).
21h15 – Guidable: A Verdadeira História do Ratos de Porão (Fernando Rick, 2008, 120’).

30/11 (Domingo)
17h – Loki: Arnaldo Baptista (Paulo Henrique Fontenelle, 2007, 120’).
19h15 – Siba: Nos Balés da Tormenta (Caio Jobim e Pablo Francischelli, 2012, 85’).
21h – Mobília em Casa: Móveis Coloniais de Acaju e a Cidade (José Eduardo Belmonte, 2014, 77’).

01/12 (Segunda-feira)
19h – Como Irritar Dândis do Hardcore: Lições Práticas Vol. 01 (Gurcius Gewdner, 2012, 15’)
19h30 – Guerrilha Gerador (Danilo Sevali, 2013, 65’).
20h45 – Renato Está Morto (Danilo Sevali, 2014, 10’).
21h – Ratos de Porão: 30 Anos Crucificados Pelo Sistema (Fernando Rick, 2014, 55’)

02/12 (Terça-feira)
19h – O Rap pelo Rap (Pedro Henrique Fávero, 2014, 73’).
20h30 – Lobão: Não Há Estilo Sem Fracasso (Fábio Salva, 2011, 15´).
21h – RPW: 20 Anos (Ivan Vale Ferreira, 2012, 52’).
03/12 (Quarta-feira)
19h – Exibição e lançamento do DVD do documentário Nas Paredes da Pedra Encantada (Cristiano Bastos e Leonardo Bomfim, 2011, 120’) pela Monstro Filmes. Debate com o diretor Cristano Bastos após a sessão.

Contatos:
Cristiano Bastos – (51) – 9555-8744 / E-mail: cristianozb@gmail.com
Blog oficial do filme: www.nasparedesdapedraencantada.blogspot.com.br
Página do Facebook: www.facebook.com/nasparedes
Monstro Discos: www.monstrodiscos.com.br
Telefone: (62) – 3281-5358
E-mail: contato@monstrodiscos.com.br

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Última exibição no cinema

Documentário sobre o vinil mais caro do Brasil será exibido pela última vez em Recife neste sábado, 15  
Nas Paredes da Pedra Encantada conta a história de Paêbirú, gravado por Lula Côrtes e Zé Ramalho

Hoje o vinil Paêbirú - Caminho da Montanha do Sol, lançado em 1975 pela dupla Lula Côrtes e Zé Ramalho, é considerado um dos mais caros do mundo, e para investigar a mística por trás dele, os jornalistas Cristiano Bastos (colaborador da Rolling Stone Brasil) e Leonardo Bomfim fizeram o documentário Nas Paredes da Pedra Encantada, que será exibido pela última vez neste sábado, 15, em Recife, antes de o filme ser disponibilizado na internet.

Para o filme, os diretores convidaram Lula Côrtes para uma viagem de Kombi de volta à Pedra do Ingá, Paraíba, o lugar místico no agreste nordestino que foi inspiração para a dupla durante o processo criativo do disco. Depoimentos de pessoas próximas aos músicos na época também integram o longa.

A exibição de Nas Paredes da Pedra Encantada marca a primeira edição do Cinema Experimental, projeto que visa dar espaço a produções independentes que passam longe das telonas de Recife, e contará com a participação de Cristiano Bastos. O evento terá também apresentações musicais e curta-metragens.

Projeto Cinema Experimental em Recife
Exibição de Nas Paredes da Pedra Encantada
Sábado, dia 15 de dezembro, a partir das 14h
Local: Café Experimental - Estrada Velha dos Macacos nº195 (Rua da Biblioteca da UFRPE)
Entrada: R$ 5

Fonte: Rolling Stone

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Exibição e debate nessa quinta (27/10)

Nessa quinta, dia 27, às 19h acontece exibição do documentário e debate com o diretor Cristiano Bastos no Cineclube IESB, em Brasília. Confira mais informações no flyer:

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Em busca do Paêbirú



O artista plástico e arqueólogo paraibano Raul Córdula (homem que, nos anos 1970, apresentou a Pedra do Ingá a Lula Côrtes e Zé Ramalho), escreveu esse texto em prosa poética que se encontra no encarte original do long-play de Paêbirú. Neste encarte, que torna o disco mais valioso ainda, também tem relatos da expedição feita por essa turma à localidade de Ingá do Bacamarte. Os relatos são assinados por Côrtes. Leia-os aqui em breve. Em 4 episódios

[Clique na imagem para ver em tamanho maior]
Fonte

sábado, 8 de outubro de 2011

No Cine São Luiz

Confira reportagem publicada nessa sábado 07/10 no Diário de Pernambuco.

Filme sobre disco Paêbirú, de Zé Ramalho e Lula Côrtes, é projetado neste domingo no Cine São Luiz
 
Júlio Jacobina/DP/D.A.Press

Zé Ramalho faz sucesso em todo o Brasil e sempre canta músicas como Avohai, Frevo mulher, Admirável gado novo e Chão de giz, que ajudaram a fazer o nome do cantor paraibano a partir do final dos anos 1970. O que muitos de seus fãs não sabem é que, anos antes, Zé já estava na ativa e tinha até gravado disco, o mítico Paêbirú, parceria com Lula Cortês.

O álbum virou tema de documentário. Zé não quis participar (Paêbirú é um assunto que ele evita), mas aprovou sua produção. Lula Côrtes morreu sem assistir Nas paredes da pedra encantada, longa-metragem que investiga esse que é um dos mais raros discos brasileiros. O LP duplo Paêbirú — Caminho da montanha do sol (1975) é o primeiro disco a levar na capa o nome do compositor de Avohai. Músico, poeta e artista plástico pernambucano, Luiz Augusto Martins Côrtes morreu em 26 de março, aos 61 anos, em decorrência de um câncer na garganta. O filme ganhou sua primeira exibição pública em 30 de abril, em São Paulo, dentro da programação do In-Edit Brasil — 3º festival internacional do documentário musical.  

O filme será projetado pela primeira vez em Pernambuco neste domingo, às 20h30, no Cine São Luiz, como parte da programação da mostra Play The Movie, do Festival Coquetel Molotov.

Dirigido por Cristiano Bastos e Leonardo Bomfim, o documentário, além de abordar a feitura do disco — conversando com vários dos envolvidos, como o cantor Alceu Valença, o cartunista Lailson de Holanda, o artista plástico Raul Córdula e a cineasta Katia Mesel — tem na figura de Lula seu fio condutor. E não teria como ser diferente. Com um carisma magnético, ele rouba a cena.

Rodado nas cidades pernambucanas de Olinda, Jaboatão dos Guararapes e Recife, e nas paraibanas João Pessoa e Ingá do Bacamarte, Nas paredes da pedra encantada é um road movie que captura muito do espirito da época em que o disco foi feito, em plena efervescência do udigrudi pernambucano. Produzido com dinheiro do próprio bolso dos diretores (orçado em aproximados R$ 30 mil), o filme acompanha Lula de volta até a Pedra do Ingá, sítio arqueológico onde se encontram as misteriosas inscrições rupestres que inspiraram as letras do álbum — que apresenta em suas músicas uma rica combinação de ritmos nordestinos e rock psicodélico.

As premissas dos diretores resultaram em vários planos sequência, longos e detalhados depoimentos, que passeiam por temas como ecologia, arqueologia, contracultura, música e lisergia, permitindo ao espectador entrar na história sem pressa. “Queríamos que o filme respirasse, fugisse de edições frenéticas, de ritmo videoclíptico. E que tudo nele fosse novo, sem imagens de arquivo — até porque elas não existem —, mostrando o que a gente viu”, conta o jornalista gaúcho radicado em Brasília Cristiano Bastos. “A ideia não era apenas entrevistar, mas olhar as pessoas. Como o Pennebaker em Don’t look back, filmando detalhes dos personagens, um filme observador”, emenda o carioca Leonardo Bomfim, mestrando em comunicação morando em Porto Alegre, em referência ao documentário do diretor americano que captura Bob Dylan em 1965.

Registro vívido
Em alguns momentos, a limitação financeira da produção surge na tela, mas isso não interfere em seu encanto justamente pela riqueza das imagens e das falas dos personagens. Há depoimentos divertidíssimos, como Lula contando como pediu Katia (sua mulher na época) em casamento ou o avistamento de elefantes em pleno sertão paraibano. Em Ingá do Bacamarte, onde se localiza a pedra, os moradores dão versões ingênuas e hilárias para a origem das inscrições. Além da natureza, a música exerce grande força no documentário. O próprio Paêbirú serve de trilhas sonora, mas foram feitas cenas musicais exclusivas.

Em uma delas, Lula e seu tricórdio (espécie de cítara popular marroquina, instrumento que ele dominava e está por todos os quatro lados do LP) acompanham, em espontânea sintonia, Alceu Valença em uma música inédita do compositor de Tropicana e Coração bobo. Em um dos depoimentos, Lula fala sobre o futuro, a vontade de construir uma nova casa no terreno que ganhara de um amigo. O músico se foi, mas permaneceu seu legado. E com Nas paredes da pedra encantada, permanece também um registro vívido desse incrível personagem da música brasileira.

Programação da Mostra Play the Movie:
SÁBADO – 08/10
17h – Sessão de fil­mes sele­ci­o­na­dos por Marcelo Gomes: “Cinema, Aspirinas e Urubus”
19h — Filme: “Gretchen Filme Estrada“
21h — Filme: “Explosão Brega”

DOMINGO — 09/10
17h — Sessão de fil­mes sele­ci­o­na­dos por Marcelo Gomes: “A Alma do Osso”
18h30 – Filme: “Daquele Instante em Diante“
20h30 – Filme: “Nas Paredes da Pedra Encantada”

Com informações de Pedro Brandt, do Correio Braziliense

Fonte: diariodepernambuco.com.br/nota.asp?materia=20111007132014

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Exibição única no Recife

Confirmado: Nas Paredes da Pedra Encantada vai para o Recife! O doc encerra a Mostra Play The Movie, que precede a edição 2011 do festival No Ar Coquetel Molotov.

O filme terá exibição única no dia 9 de outubro, às 17h, no Cinema São Luiz (Rua da Aurora, 175, Boa Vista). O diretor do filme Cristiano Bastos estará presente para contar sobre a aventura que foi realizá-lo.

Confira a programação completa do festival, cujo line-up está matador, com shows e oficinas aqui.

Lula Côrtes e Alceu Valença por Flora Pimentel

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Entrevista com Alceu Valença

Nas Paredes da Pedra Encantada está voltando ao nordeste. Depois de ser exibido em Salvador pelo Festival In-Edit, o documentário está chegando em Recife.

Em homenagem a esse reencontro, postamos entrevista de Alceu Valença concedida a Cristiano Bastos e publicada em 2008 na revista Brasileiros. Confira:

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BOM DE PROSA
por Cristiano Bastos
Alceu Valença fala sobre rock, movimento mangue beat, mercado musical e resgate da cultura regional


O casarão do músico pernambucano Alceu Valença é um dos pontos turísticos da histórica Olinda. Do andar de cima se avista o verdejante mar que rodeia o Brasil antigo.Não é possível mirar o oceano sem pensar na história do país. Por instantes, paro e a imagino tudo o que de melhor (e pior), em mais de 500 anos, desembarcou por essas divisas marítimas. É difícil descrever a sensação.Disputas, comércio de especiarias, tráfico de escravos – e o traço holandês, cuja herança cultural afeiçoa-se a rostos, à arquitetura de prédios históricos e aos mínimos detalhes da colorida complexidade de Pernambuco.

Brincalhão e sagaz, Valença é um prosador nato e o principal animador do carnaval da cidade. Todos os anos, diretamente de sua sacada, ele esquenta os foliões tocando frevos, toadas e contando animados causos de nordestinidade. À revista Brasileiros, ele falou de tudo um pouco: sua infância, as influências musicais, carreira, shows. Para quem pensa que mercado independente é coisa de artista moderno, Alceu foi um dos primeiros artistas a ter o comando da própria carreira – um feito e tanto ainda hoje no Brasil.

Não toco na rádio, não pago jabá e não estou em nenhuma grande gravadora. Perguntam-me sempre: 'Por onde andavas, tão desaparecido?' Eu falo: 'Por aí, velinho, dando show para trinta mil pessoas em algum lugar desse país'", diverte-se. "Entendeu, velho?", diz seu bordão predileto. E assim iniciamos a conversa.

Zé Ramalho, Alceu Valença e Lula Côrtes: o "Trio de Catende". O clipe de "Vou Danado pra Catende" é a única filmagem do grupo existente. Gravado no Festival Abertura, da Rede Globo (1975), cujo nome fora sugestão do general Figueiredo à abertura política. Nele também se apresentaram Jards Macalé e Walter Franco.

Onde começa sua história?
Alceu Valença: Na Fazenda Riachão, em São Bento do Riachão, uma cidade entre o agreste e o sertão pernambucano. Foi nesse lugar que ouvi os primeiro sons de minha vida: a voz melancólica dos cantos dos vaqueiros boiadores. Escutando o cantado dos vaqueiros, a voz dos cegos de feira. Vivi um nordeste totalmente diferente ao de hoje. Aliás, um mundo completamente diferente. Houve uma revolução tecnológica. Participei de duas: saí do canto medieval e vim bater na internet.

Canto medieval?
Alceu: Os aboios são medievais, o modo como os violeiros e os cegos de feira tocam. São menestréis, então, é uma tradição ibérica que veio bater no Brasil, evidentemente na época do descobrimento. Convivi muito com isso, meu avô manejava uma viola que só. Também fazia versos de improviso, além de tocar e ler música. Nessa cidade, São Bento do Una, eu também ouvia as vozes e sons da feira, mas já estão se extinguindo.

Como você tornou-se artista?
Alceu: Minha família toda é muito musical, apenas meu pai e minha mãe não são. Como papai e mamãe não faziam música, eu também não podia. Ficava ali sem poder cantar, só ouvindo. Não poder tocar e cantar foi um complexo terrível que carreguei até os 13 anos. E eu queria tocar violão porque havia uma febre na minha rua. O velho achava que música era algo estigmatizado, coisa de cachaceiro... (pára para pousar para a foto).

Como fazia para ouvir música?
Alceu: Em minha casa não tinha toca-discos. Até que um dia, depois de tanta reclamação, compraram uma radiola. Papai comprou, mas não liberava grana para comprar os discos. A mesada era muito pequena. Era minha irmã que comprava os discos, mas eles não faziam minha cabeça. Ela tinha discos de Cauby Peixoto, Roberto Carlos, que era uma coisa que eu gostava, mas muito distante. Tinha um disco do Peri Ribeiro de bossa nova que eu gostava! Mamãe terminou comprando um violão para mim, só que não me deram professor. Aprendi sozinho. Mas, até hoje, não toco muito bem.

Quais foram suas principais influências?
Alceu: Luiz Gonzaga e aqueles que o influenciaram. Gonzaga é filho musical dos mesmos violeiros de minha infância. Ele fez a síntese dessa cultura – digamos que ele seria os Beatles. Ouço tanto Luiz Gonzaga quanto os músicos anônimos que o influenciaram. É diferente do cara que, hoje, pega o disco do Gonzaga sem ouvir o que esteve atrás.

E a influência da cultura brasileira, do folclore, entre os músicos?
Alceu: O folclore já morreu. Quando se fala em folclore existe um senso pejorativo a respeito. Penso no folclore como o arcabouço cultural que um povo construiu. No Brasil, deixaram o folclore de lado (imita contorcendo o rosto de modo blasé), viraram a cara. Mas se metem no blues, por exemplo, que particularmente, acho maravilhoso. Não se dão conta que o blues, na verdade, nada mais é que do que folclore. Vem da raiz folk. Só que é folclore norte-americano. Existe no Brasil uma total falta da curadoria. Ninguém sabe mais "o que é o que não é".

O que falta no Brasil?
Alceu: Nós vivemos carentes de novidades, de oportunidades para conhecer coisas mais genuínas. Dentro da classe intelectual há uma vontade de mudança, mas pouco muda. Em 1988, eu estava preocupadíssimo, não suportava mais o meu próprio sucesso. Queria que aparecesse alguma coisa, e apareceu, não foi? Chico Science, com o mangue beat. E fui vítima desse “novo” que surgiu. Não por parte do mangue beat, mas dos intelectuais que renegavam o passado recente da música pernambucana. Fui um artista que foi “destruído” com a vinda do mangue. E por quê? Achavam que duas vertentes, o novo e o velho, não davam para conviver dentro do mesmo cenário. Fiquei como careta da história. Mas o povão, não. O povo, me público, não me viu como “ultrapassado”. Neste momento eu já tinha rompido com tudo, já achava uma bosta a indústria de cultura. Disse a mim mesmo: "Vou exortar o que resta do meu público, e que já era algo enorme. Na época de rejeição, cheguei a 26 mil pagantes. Fui viajando pelo Brasil e acumulei um público que é absurdo. Sou uma das exceções do mercado.

Como você avalia o mercado musical atual?
Alceu: No nordeste, está acontecendo uma coisa que não é fenômeno musical - é um fenômeno mercadológico. Dinheiro, negócios. Como você faz para ganhar dinheiro e conservar seu valor artístico? Tenho um público maravilhoso, imenso. Sou um fenômeno, fenômeno que a mídia não viu – e estou literalmente cagando para a mídia, pode escrever. Mesmo assim, qualquer show que faço é entupido de gente. Eu convoco o povo, é uma loucura.

Fonte: http://www.revistabrasileiros.com.br/edicoes/13/textos/146/

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Zé da Flauta

Continuando a série de entrevistas feitas por Cristiano Bastos em 2008, confira hoje uma conversa com Zé da Flauta (blog, myspace), um dos "personagens" de Paêbirú.

Em 1974, participou da gravação do LP gravado em quatro canais, na Rozemblit, pela dupla Zé Ramalho Lula Côrtes. Paêbirú ainda teve grandes participações de músicos como Geraldo Azevedo, Ivinho, Paulo Rafael e Dikê. É de Zé o sax da faixa "Nas Paredes da Pedra Encantada". E foi também sua primeira gravação profissional.

Iniciou sua carreira artística em 1970, na cidade de Recife, tocando com músicos como Don Tronxo (guitarrista da trovejante "Raga dos Raios", da parte Fogo), Agrício Noia, Robertinho do Recife, Marconi Notaro e Flaviola. O Zé nos conta um poucas de suas histórias daquele tempo – e de agora. No videoclip de "Vou Danado pra Catende", o Zé é o "cara da bata".



Zé, tudo bom?!
Zé da Flauta:
Tudo ótimo, como sempre!

Como era o ambiente das gravações e composição de Paêbirú, dá pra lembrar?
Zé da Flauta:
Eu estava com 18 anos quando decidi ser músico profissional. Foi quando também conheci Lula Côrtes e Kátia Mesel, por intermédio de uma prima que era amiga deles. Logo em seguida, conheci Lailson no Conservatório Pernambucano de Música, onde me iniciei nos estudos. Vivíamos na repressão militar, religiosa e familiar e, a casa de Beberibe, onde Lula e Kátia moravam, era o verdadeiro templo da liberdade e da contra-cultura. Um lugar onde aprendi muito sobre arte e liberdade de expressão. Lá se conversava e se fazia de tudo, inclusive se fumava muita maconha. Se falava muito sobre arte. Foi nesse ambiente que vi nascer Paêbirú e outros discos dos quais participei. Ninguém sabia o mínimo de teoria musical: tocavamos por pura intuição e rebeldia. Eu mesmo estudava flauta e resolvi comprar um sax que fora de Felinho, um grande saxofonista da década de 50 em Recife. Felinho foi o criador da improvisação no frevo. Me senti honrado por comprar tal instrumento. Mas, como não conhecia direito o saxofone, paguei por um objeto defeituoso que, na realidade, não servia nem como luneta. Era difícil tirar som naquele instrumento. Eu não tinha uma boquilha boa e não encontrava a palheta certa. O que me lembro claramente é que cheguei na casa de Lula com ele debaixo do braço e, duas horas depois, estava no estúdio da Rozemblit gravando com ele e Zé Ramalho. Nunca vou me esquecer disso, pois aquela foi a primeira vez que eu entrei num estúdio para gravar como músico.

Você toca com frequência na Europa. Já vieram lhe comentar sobre Paêbirú?
Zé da Flauta:
Sim! Uma vez em Berlim, 2006. O pessoal de uma rádio, com uma intérprete brasileira. Perguntaram sobre Paêbirú e também sobre o grupo de heavy metal Hanagorick, daqui do interior de Pernambuco. Esses caras fazem o maior sucesso por lá, são famosos. São de Surubim, a terra do Chacrinha.

Dá pra definir "udigrudi"?
Zé da Flauta:
É apenas uma terminologia. Naquele caso, nos anos 70, não caracterizou um movimento musical. Era apenas um momento de excitação, perturbação, inquietação artística. Não foi uma idéia com manifesto, objetivo e consistência, como foi o mangue na década de 90.

Show em Montreux,1982

Alguma história para nos contar de 33 anos atrás?
Zé da Flauta:
Cara, são várias! O problema com a censura era grande, com a Polícia Federal, também. Para se fazer um show, tínhamos que fazer prévia para a polícia... Só então eles decidiam se tua banda podia ou não fazer o show, peça de teatro ou o que fosse. Para se colocar um cartaz na rua, ou mesmo indoor, por exemplo, tinha que ter o carimbo da censura política e estética e, às vezes, isso só podia ser feito no dia do show. O tricódio de Lula, que ele trouxe do Marrocos, virou um símbolo visual, sexual, sonoro da época. Todos os discos gravados por essa turma, inclusive o meu com Paulo Rafael, tiveram a participação de Côrtes. Veja como ele dá um brilho especial em "Vou Danado Pra Catende", do Alceu Valença. Neste momento, estou escrevendo um livro de memórias que pretendo lançar no final de 2010.

E hoje?
Zé da Flauta:
Ando tocando no meu estúdio, compondo trilhas para TV, filmes, peças de teatro, produzindo discos e artistas. Atualmente estou trabalhando com a SpokFrevo Orquestra, um grupo que ajudei a criar com o objetivo de mostrar o frevo apenas como linguagem musical, sem o folclore. Já tocamos na China, por toda Europa. Vamos para a Índia em outubro. Nós somos uma Big Band de frevo. Eu não toco na orquestra, apenas produzo. Nos assista.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Lula Côrtes: "Sou um Factótum"

Continuamos com a série de entrevistas produzidas por Cristiano Bastos para o documentário Nas Paredes da Pedra Encantada. Confira conversa com Lula Côrtes em 2008.

Divulgação

Qual a importância de Paêbirú para a música brasileira?
Lula Côrtes
: Na época em que foi feito, nenhuma. Mesmo após o lançamento, a recepção foi fria. As pessoas não estavam preparadas pro espírito do disco. Paêbirú é um disco de "hoje", na verdade.

Como foram criados os efeitos do disco?
Lula Côrtes
: Se costuma pensar que a maioria dos efeitos são eletrônicos, mas, na realidade, são panelas com água, pios de caça, vozes humanas, chocalhos de cabra. A introdução que antecede o saxofone de "Segredo de Sumé" é uma corneta de vender picolé. Louco, né?!

O que descobriram de mais legal fazendo Paêbirú?
Lula Côrtes
: A amizade e, depois, harmonia pra continuarmos trabalhando em vários álbuns. Cada qual, após Paêbirú, seguiu seu caminho: Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Lailson, Zé da Flauta, Jarbas Maris.


Que bandas vocês ouviam?
Lula Côrtes
: It's a Beatifull Day, Crosby, Stills and Nash, Tyranossaurus Rex, Neil Young, Captain Beefheart, Grand Funk Railroad, e mais uma penca de coisas…

Alguma obra foi modelo para as "loucuras" do grupo?
Lula Côrtes
: Os discos que mais influenciaram foram os temáticos: Viagem ao Centro da Terra, Ozzy Bizza, Frank Zappa & Mothers of Invention. Dos brasileiros, basicamente Mutantes. Foi Duprat quem abriu nossas cabeças.

Qual é a energia da Pedra do Ingá?
Lula Côrtes
: A energia do mistério, do lendário que ficou no inconsciente coletivo e gerou muitas lendas mal-assombradas... Ainda hoje procuro outras formas de energia no local.

Lula Côrtes e o filho Haiminho/Divulgação

O que há de mais revelador em toda essa história?
Lula Côrtes
: Às vezes, estamos num lugar tão raro, em beleza e mística, que nem nos damos conta. No som, a fusão do folclore com a abordagem livre, vanguardista e psicodélica que tivemos.

Depois de Paêbirú, enveredou por qual trilha musical?
Lula Côrtes
: O caminho do RPB: Rock Popular Brasileiro. Já trabalho com a banda Má Companhia, de Recife, há 17 anos.

E hoje?
Lula Côrtes
: Hoje sou um eterno futucador de coisas, um factótum.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Zé Ramalho fala sobre Paêbirú

A partir dessa semana, publicamos uma série de entrevistas que serviram como inspiração e material de pesquisa para a produção de Nas Paredes da Pedra Encantada.

Começamos com Zé Ramalho que, em março de 2009, é entrevistado por Cristiano Bastos, um dos diretores do documentário. A matéria é publicada na edição nº30 da revista Rolling Stone. Leia aqui a entrevista.

Abaixo, estão extras da conversa entre Cristiano Bastos e Zé Ramalho, onde falam sobre o disco Paêbirú. Confira.

Por que você não quer mais falar sobre o álbum Paêbirú?
Zé Ramalho: As coisas são muito simples. Não vou citar aqui razões pessoais, particulares. A minha recusa em falar é assim: quando Paêbirú foi lançado, há mais de 30 anos, na época em que saiu, apesar da cheia que aconteceu, ninguém falou nada sobre ele. Alguns álbuns foram mandados aqui pro Rio de Janeiro. Por que tantos anos depois? Deviam ter falado sobre isso naquela época! Eu acho apenas incrível que se vislumbre tudo isso em torno de um trabalho que já foi feito há muito tempo.

E o Dom Tronxo, que tocou aquela guitarrona em "Raga dos Raios", do Paêbirú?
Zé Ramalho: Dom Tronxo tornou-se, depois, grande compositor. Ele tem discos gravados com selos alternativos. O encontrei em Caruaru, cerca de um ano atrás, morando numa fazenda. Fui ver um show que ele estava fazendo. O nome dele, na verdade, é João Fernando. Ele tinha um grupo chamado Dom Tronxo & As Borboletas Cor de Leite. Aí você pensa que vai entrar um cara com a banda, e entra o cara sozinho. Ele se chamava assim. Dom Tronxo era um cara muito loucão. Nas experiências de cogumelo ele sempre tava no meio. No encarte de Paêbirú ele aparece recebendo um cogumelo de uma criança. Quando ele ficava doidão, ele dizia assim pra gente: "Vem aqui. Vou mostrar que consigo mexer a lua com o dedo". (muitas risadas)

E a Pedra do Ingá?
Zé Ramalho: Essa pedra é o seguinte: de vez em quando faço visitas à Pedra do Ingá. É curiosa porque ela me dá projeções de como imagino certas coisas: criação do mundo, primeiros habitantes da terra, criaturas do espaço que vieram aqui. Eu sou agnóstico, como John Lennon: imagino o mundo sem religiões. Eu aceito a explicação, que cada vez é mais permanente, que foram criaturas do espaço que vêm nos visitar. Faço parte dessa legião de ufólogos que tem grande esperança numa revelação. Me sinto privilegiado em ser contatado por cientistas e ufólogos. A experiência de "Avôhai", que contei sobre aquela viagem de cogumelos, "as cortinas", tem uma presença alienígena. A visão que eu tive, na verdade, foi de uma nave gigantesca que estava em cima de mim (Ramalho diz mirando o teto), enorme. Por entre as nuvens dava pra ver a sombra da nave – imensa, gigantesca. Havia um apresença alienígena, com certeza. E quando olhei para o chão, estava repleto de ollhos de gente a me observar. Isso aconteceu perto de Recife, num pasto chamado Rio Botafogo, uma fazenda enorme onde os malucos descobriram as amanitas que nasciam por lá. Essa experiência lisérgica foi definitiva para toda minha vida.

A Elba, sua prima, se deu mal com as declarações dela...
Zé Ramalho: Ela deu mole com aquela história de dizer que foi "chipada". A Elba, da mesma forma que fala de UFO, fala de santas. Não pode.

Ela fez um "sincretismo espacial".
Zé Ramalho: Muito louco isso. Uma coisa dilui a outra. Se bem que até o Vaticano já mandou dar o seguinte recado: "A Santa Igreja aceita todas as criaturas do espaço porque são todas filhas de Deus" (risos). Mas algo importante está criptografado no painel da Pedra de Fogo. Ela está ligada com Machu Pichu e o Caminho da Montanha do Sol passa pela Pedra do Ingá. Foi uma criatura só que fez tudo aquilo... A Pedra do Ingá do Rio de Janeiro, onde o pessoal solta de asa delta, tem a forma de uma cara gigante. Todas essas inscrições foram feitas numa mesma "caminhada", que algum ser, numa nave gigantesca, fez pelo planeta milhares anos atrás.

Você tem o Paêbirú?
Zé Ramalho: Sim, o vinil pirata alemão.

O que planeja daqui pra frente?
Zé Ramalho: Antes, passar férias na Paraíba, na casa de praia que tenho em João Pessoa, à beira do mar, em Areia Vermelha. O melhor lugar do mundo. Eu passo um mês em contato com a natureza lá. Eu fico na praia com a minha mulher e os filhos, e me sinto muito bem com as pessoas que passam e acenam pra mim. Eles vão lá e ficam me cumprimentando o dia inteiro.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

As pedras encantadas de Lula Côrtes

Republicamos aqui o texto do blog Encontro Radical, em que o professor de educação musical Ricardo Moreno de Melo compartilha suas impressões sobre a exibição do filme no RJ, dentro da programação do festival In-Edit 2011.

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AS PEDRAS ENCANTADAS DE LULA CÔRTES
por Ricardo Moreno de Melo

A noite era convidativa. Uma lua alta e minguante desenhava no céu uma luminosidade inspiradora. Afora o problema de estacionamento, tudo concorria para uma noite auspiciosa para assistir um documentário, que para além de suas qualidades intrínsecas, era pra mim um encontro com uma cena musical que – apesar de eu não ter convivido com ela diretamente – fazia parte de minha adolescência. O documentário era Nas paredes das pedras encantadas dos diretores Leonardo Bomfim e Cristiano Bastos, e veiculado no Rio de Janeiro na mostra de documentários musicais In-Edit.
Encarte de Paêbirú
O documentário é uma tentativa de recriar as histórias em torno do álbum Paêbirú gravado em 1975 pelos então desconhecidos artistas Zé Ramalho e Lula Côrtes – artista recentemente falecido. Foi o primeiro disco do Zé, e o segundo de Lula, que dois anos antes, 1973, havia gravado o não menos psicodélico Satwa, com o hoje cartunista Laílson. Paêbirú seguiu uma trajetória que o envolveria anos mais tarde em uma atmosfera meio mítica. Isso porque logo depois de concluído, a Rozemblit, gravadora pernambucana na qual o disco foi gravado, sofreu uma inundação (uma cheia como dizemos em bom pernambuquês) e sobraram apenas algumas centenas do LP. Esse acontecimento fez com que as poucas unidades que circularam na época fossem vendidas "a peso de ouro". Parte deles, inclusive, foi vendida pra gente de outros países, o que acabou fazendo-o conhecido de pesquisadores estrangeiros ensejando com isso seu lançamento em CD na Inglaterra e Alemanha.

A inspiração desse disco está num sítio arqueológico situado na Paraíba em uma localidade chamada Ingá do Bacamarte, na qual se encontra uma pedra com muitos desenhos supostamente criados por uma antiga civilização já extinta. O primeiro contato que se tem notícia com este acervo arqueológico foi feito em 1598 pelos soldados liderados pelo capitão-mor da Paraíba, Feliciano Coelho de Carvalho, quando os mesmos iam no encalço dos índios potiguares. Essa história foi contada no citadíssimo livro "Diálogos das grandezas do Brasil", de 1618, cujo autor, Ambrósio Fernandes Brandão, interpretava os tais símbolos como "figurativos de coisas vindouras". Algo como uma profecia.

O documentário não apresenta imagens da época. Talvez porque não haja mesmo nenhum registro em filme daqueles momentos, mas ele consegue recriar o ambiente místico alucinógeno em que o disco foi concebido, e quais eram as ambições estéticas existenciais dos artistas envolvidos. Há momentos muito interessantes tais como o encontro de Lula e Alceu, ou as entrevistas dadas pelos moradores da redondeza da Pedra do Ingá, localidade onde se encontra a tal pedra mística que serviu de inspiração para Lula e Zé. Mas não há dúvida que o ponto alto do documentário são as falas bem humoradas e inteligentes do próprio Lula Côrtes. Logo no início ele diz, em tom de chiste, que é muito dura a vida de um “pobre star” brasileiro. Isso ele fala quando estão indo na expedição à Pedra do Ingá “no pior carro do mundo, com a pista molhada e o motorista chama ‘Seu Morte’ ”. Sem dúvida, temos que concordar com ele!

Divulgação
Lula Côrtes foi um dos artistas mais “roots” (aprendi essa com meu filho) do cenário artístico musical do Brasil. Inquieto; culto; bom letrista; bom compositor e dono de um timbre de voz muito bonito, mas incapaz, assim me parece, de produzir sua própria carreira, como fizeram Alceu, Zé Ramalho e outros. Lula permaneceu até o final de sua vida como um marginal na MPB. No início da década de 1980 até que houve uma tentativa de colocá-lo em outro plano. Ele gravou pela gravadora Ariola, um álbum muito bem gravado, com encarte bonito e bom som, chamado “o gosto novo da vida”. O disco seria para colocá-lo num plano nacional, com shows de divulgação no Brasil inteiro. Era um disco que sem dúvida cairia no gosto do público, pelo menos de um público que curtia MPB, etc., mas o disco, apesar de muito bonito, não aconteceu. E não foi por causa de enchentes ou qualquer ocorrência fortuita, mas talvez por uma incapacidade de Lula em administrar a própria carreira. Uma pena para os amantes dessa senhora chamada MPB, pois muitos se tornariam, como eu me tornei, fã desse artista pernambucano.

Em muitos momentos da projeção eu ficava pensando na necessidade de se fazer conhecer aquela cena musical que se desenvolvia em Pernambuco da década de 1970. Era sem dúvida uma ocorrência antropofágica, na qual os jovens músicos assimilavam o rock e o fundia com as manifestações culturais locais. Era uma re-leitura do rock na qual lisergia e contestação se associavam ao canto árido dos caminhos do sertão. Mas tudo isso feito por jovens urbanos cheios de referências culturais da chamada “alta-cultura” ocidental e elementos da cultura oriental (Lula trouxe do Marrocos uma cítara popular batizado por ele de tricórdio). Este foi um momento de uma florescência musical na qual muitos artistas despontaram e criaram coisas belíssimas. Ali estavam Flaviola, o grupo Ave Sangria, Marconi Notaro e outros tantos músicos como Zé da Flauta, Robertinho do Recife e Paulo Rafael. Esta cena precisa ser revisitada!

Registre-se ainda que tudo isso acontecia em paralelo com o conhecido movimento Armorial, idealizado por Ariano Suassuna. Como eram tempos bastante radicalizados esses dois grupos, por motivos estético-existenciais, não se misturavam. Depois tudo mudou, pois Antônio Nóbrega, filho dileto do movimento Armorial cantava junto no carnaval com Chico Science, filho dileto da cena rock-underground recifense.

No final da película dei de cara com Lenine, que olhava absorto para a tela no momento em que rolavam os créditos. Seu olhar parecia focado em algum ponto do passado, em que uma geração de artistas pernambucanos, como ele, mostrou uma força e uma qualidade criativas dignas de serem conhecidas pelo Brasil e pelo mundo. Viva a multifacetada cultura musical brasileira!

terça-feira, 7 de junho de 2011

Pré-estreia em Porto Alegre

A produção da Kino Beat fez um vídeo com trechos do filme e imagens da pré-estreia do doc Nas Paredes da Pedra Encantada em Porto Alegre, em sessão comentada com o diretor Leonardo Bomfim no dia 19 de maio. Confira.